segunda-feira, 22 de agosto de 2016

Na República das bananas: se beber, não vote


Se beber, não vote
por: Alex Solnik

O primeiro grande escândalo dessa Olimpíada foi “O Caso dos Biscoitos”. 

Caíram de pau num jornalista americano que achou insossos os biscoitos de polvilho da marca “Globo” vendidos há 40 anos nas praias cariocas. Foi um Deus nos acuda! Como é que um gringo vem aqui denegrir uma das mais sólidas e indiscutíveis tradições cariocas?! Quem estaria por trás disso? Se alguém não gosta de uma coisa tão saborosa “bom sujeito não é”.  Qual é a dele? Por pouco ele não foi expulso por ter uma opinião diferente da maioria. Não, ele não tem o direito de não gostar de biscoitos de polvilho!

Mas isso foi só um aperitivo. O mundo caiu mesmo quando três nadadores americanos ousaram denegrir a excelente imagem que o Brasil tem lá fora prestando falsa declaração à polícia, de que tinham sido assaltados, quando, na verdade, nossos argutos Sherlocks descobriram que eles quebraram o banheiro de um posto de gasolina depois de encherem a cara numa festa olímpica onde Baco era o principal homenageado.

Um episódio que poderia fazer parte do roteiro de uma dessas chanchadas de Hollywood da série “Se beber, não case” e que não deveria merecer mais que uma nota de rodapé foi transformado num escândalo de enormes proporções que mereceu comentários ácidos de toda a imprensa, inclusive dos jornalistas amadores que infestam as chamadas “redes sociais”. 

Só faltou pixar os muros com frases nacionalistas tais como  “Americanos Go Home” ou chamar o embaixador americano para dar explicações. Como é que esses americanos idiotas vêm querer enganar a nossa gloriosa polícia e denegrir a nossa imagem internacional?! Vi inúmeras mensagens nas “redes sociais” dizendo “ah, se negros tivessem feito o que eles fizeram as consequências seriam terriveis” o que, sem dúvida mostra como a nossa polícia é civilizada. E que os autores dos comentários denigrem muito mais a nossa imagem do que os americanos bêbados.
   
Não quero aqui defender três americanos abilolados, nem deixar de reconhecer que foram idiotas, por mais medalhas de ouro que tivessem ganho, mas, aqui entre nós, que ninguém nos ouça (pois corro o risco de passar por cúmplice deles e receber as mesmas porradas): o segurança do posto precisava apontar o revólver para eles e chamar a polícia depois que eles quebraram o banheiro e arrancaram um cartaz de propaganda? Precisava fazer isso com três bêbados desarmados? Não bastaria dizer-lhes “vocês fizeram merda, paguem o prejuízo e vazem”? E nenhuma imagem de ninguém seria denegrida?!

Mas, não. O segurança do posto apontou o revólver, chamou a polícia, os bêbados viraram delinquentes em cinco minutos. Se ficaram sob a mira de uma arma no estado etílico em que se encontravam estariam muito errados em interpretar aquilo como um assalto? Eles mentiram ou simplesmente não entenderam o que acontecia?

Mas deixa isso pra lá. É um caso policial para a polícia resolver. O que eu queria dizer era outra coisa.

O que me deixou perplexo foi o fato de ter sido considerado um escândalo e uma tentativa de denegrir a imagem do Brasil três americanos bêbados comunicarem um assalto inexistente e ser considerado normal o fato de 59 senadores, sóbrios, transformarem em ré uma presidente que não cometeu crime!

O que macula mais a imagem do país? A denúncia de um assalto que não existiu ou a denúncia vazia contra uma presidente eleita em início de mandato?

O que macula mais a imagem do Brasil: três americanos bêbados que inventam um crime para explicar a bebedeira ou um juíz do Supremo Tribunal Federal afirmar que a Lei da Ficha Suja “parece ter sido escrita por bêbados” e a maioria do STF permitir candidaturas de envolvidos em graves denúncias?

O que  macula mais a imagem do Brasil? Três americanos bêbados que mentem ou a notícia de que o presidente de uma grande empreiteira trocava favores com um ministro imaculado do STF?

A quem interessar possa (o que talvez sirva para atenuar o ódio contra mim): adoro biscoitos de polvilho de qualquer marca!

Por Alex Solnik, jornalista. 
Já atuou em publicações como Jornal da Tarde, Istoé, Senhor, Careta, Interview e Manchete. É autor de treze livros, dentre os quais "Porque não deu certo", "O Cofre do Adhemar", "A guerra do apagão", "O domador de sonhos" e "Dragonfly" (lançamento setembro 2016).