Constatação: na Realidade Brasileira | O Golpismo Resiste
Por Miguel Paiva(¹)
Muitos brasileiros, sobretudo os de classe média, têm mentalidade
golpista. Basta dar uma olhada na nossa História para constatar isso. Depois da
nova república os militares e oligarcas em geral passaram a ter a preferência
da população. Diga-se população com uma boa parcela de generosidade. Os pobres,
negros, mulheres e marginalizados da época não tinham voz, eram subpopulação.
Os brancos, héteros, ricos e masculinos decidiam os destinos da nação e quando
decidiam fazer uma pequena guerra ou revolta colocavam os jovens e negros à
frente das tropas para que morressem defendendo seus princípios, ou seja, os
das oligarquias.
Trocavam de governo como quem troca de cueca e quando vemos os
filmes hoje, excelentes por sinal, sobre aqueles anos, a Revolução Paulista, a
Revolução de 30 (sim, eram chamadas de revolução) constatamos isso. Cadê o
povo? As revoltas populares quando aconteciam eram massacradas pelos exércitos
dos brancos e maltratadas pelos livros de História.
Com o passar dos tempos isso foi mudando. Homens e mulheres puderam
votar. O povo começou a aparecer até que em 1964, com a revolta dos marinheiros
e a possibilidade de reformas agrárias no campo fizeram com que se
estabelecesse no Brasil uma ditadura que não disfarçava mais os interesses a
defender. Antes disso, outras tentativas de golpes aconteciam, mas quase nunca,
ouso dizer, com iniciativa popular. Em 1964, lutando contra a ditadura, o
cenário mudou. Não que as classes populares tenham tomado as ruas, mas muita
gente que vinha de baixo começou a lutar.
Já não era mais aquela movimentação vinda de mais um pequeno golpe
de estado. Mesmo a revolta dos tenentes em 1922 ou a Intentona comunista em
1935 tinham um sabor de golpe de estado, de classe média e se limitavam aos
quartéis.
Em 1964 a reação foi pra valer e os porões da ditadura se encheram
de gente. A classe média que ajudou o golpe se mantinha e passava distante do
que acontecia. Torcia pelo golpe, mas não queria que o sangue sujasse suas
mãos. Os militares continuavam sendo vistos como uma casta, apesar da
incompetência em administrar um país. E incompetentes seguiram mesmo com o
clamor de certos grupos para que voltassem.
E assim nossa história seguiu até que a redemocratização mostrou
que se podia ter um governo estável e democrático que procurasse o
desenvolvimento e o bem estar da população. Sobretudo os governos populares do
PT. Mas aquela elite pró mercado financeiro que, de uma certa forma, substituiu
a casta oligarca do início do século XX continuava insatisfeita. Fez de tudo
para minar esses governos. Conseguiu derrubar a Dilma em mais um golpe para a
coleção e não satisfeita colocou no poder um ex- militar e um ministro da
economia simpático ao mercado para ter a possibilidade de trazer mais
apoiadores. Aquela sanha direitista seria controlada em prol de Paulo Guedes na
Economia. Ledo engano. Não deu certo e apesar das forças contrárias, Lula
voltou. Conseguiu sair da prisão que mais um pequeno golpe disfarçado arrumou
pra ele e se elegeu.
Mas a mentalidade golpista continua. Parece que não querem um
governo estável e desenvolvimentista. Preferem uma politica econômica que
favoreça o mercado e pronto. O resto é comunismo. Hoje, a impressão que passa,
é que estão à espreita e que qualquer brecha para poder tentar mais um golpe,
trazer alguém que desestabilize o governo para que o mercado possa sofrer sua
massagem estimulante de volta aos palcos. Não sossegam. Preferem a ameaça de um
governo autoritário (que na realidade não os ameaça) a um período de
crescimento. Lutam contra a educação e a informação para que o povo que fica
não tenha o que dizer nem o que pensar. Melhor assim pra eles.
A instabilidade significa mais dinheiro no bolso deles. Um
congresso atrasado significa possibilidade de pautas conservadoras e contra o
desenvolvimento. São as oligarquias disfarçadas de mercado financeiro e de
economia moderna que tentam sempre mostrar suas garras e se eternizar no poder.
Mas continuamos aqui vigilantes. Queremos uma democracia e a
possibilidade do povo se desenvolver. Com justiça, paz e sem golpes. A vida
pode ser animada sem essa instabilidade que só favorece a poucos.
(...)