terça-feira, 12 de agosto de 2025

O Racismo Institucional Nosso de Cada Dia e, ...O ‘proibidão militar’!

O Racismo Institucional Nosso de Cada Dia e... | O ‘proibidão militar’ e o preço que pagamos para a polícia executar gente pobre e preta

Por Jessica Santos(¹)

Estou há 5 anos como editora de relacionamento da Ponte e já vi muita coisa chegando até nós. Muito absurdo policial, investigativo e jurídico de toda ordem. Mas precisei assistir duas vezes ao vídeo do grupo de formandos do recém-encerrado 38º Curso de Formação de Soldados da Polícia Militar (CFSM) de Mato Grosso do Sul, cantando a plenos pulmões seu “proibidão da morte”, como apelidei carinhosamente.

A letra não tem nenhuma metáfora. É direta e reta sobre o que esses agentes recém-formados são preparados para fazer: “Bate na cara, espanca até matar. Arranca a cabeça e joga ela para cá. O interrogatório é muito fácil de fazer: eu pego o vagabundo e bato nele até morrer. Essa daqui poucos conhecem. É faca da PM que cancela CPF”. Pelo que nossa redação apurou, trata-se de uma adaptação de outro “proibidão” militar chamado “Eu sou a morte” – parte do cancioneiro de guerra das Forças Armadas.

Imagine se essas mesmas palavras fossem letras de expressões periféricas e pretas no funk ou rap. A imprensa hegemônica e os conservadores já teriam gritado “isso é apologia ao crime”. E quando são agentes públicos pagos com o dinheiro dos nossos impostos gritando esse tipo de coisa a plenos pulmões? É o quê? A 5ª Sinfonia do Beethoven?

O comando da Polícia Militar do Mato Grosso do Sul disse, em nota, que “lamenta o ocorrido e esclarece que o episódio consiste em uma manifestação isolada, não representando os valores, princípios e o padrão institucional da corporação”. O engraçado é que esse ato aconteceu dentro de estabelecimento da própria corporação e não dentro de uma caverna. Já o Ministério Público do Mato Grosso do Sul disse que ainda vai analisar detalhadamente o vídeo de 36 segundos, mas que o grito “é incompatível com os princípios constitucionais que regem a atuação das forças de segurança pública”.


“É faca da PM que cancela CPF”, cantam policiais militares pagos com o dinheiro público da sociedade que deveriam proteger da violência. Não se trata de “uma manifestação isolada”, como disse em nota o comando da PM-MS. É método

Estou 

























Um grito de guerra como esse não é para quem vai proteger e servir, mas matar – como aconteceu com Jefferson de Souza, o jovem alagoano em situação de rua executado por agentes da PM paulista, que mentiram ao relatar o homicídio. Com Guilherme Dias, jovem negro morto por um PM ao sair do trabalho. Com a adolescente Victória Manoelly, morta durante abordagem. Ou com Kathlen Romeu, grávida morta pela PM do Rio de Janeiro. Exemplos de casos que tiveram atualizações essa semana. Em 11 anos da Ponte, são dezenas e dezenas de histórias semelhantes, de violência contra idosas a execuções de crianças de 4 anos, todas cometidas por agentes de segurança.

Volto a destacar aqui a questão de que policiais são agentes públicos pagos com dinheiro de nossos impostos. Só em 2024, o poder público (União, Estados e Municípios) gastou R$ 153 bilhões com a segurança pública no Brasil, de acordo com dados que analisamos na edição 2025 do Anuário Brasileiro de Segurança Pública. Desse total, o policiamento recebeu R$ 39,2 bilhões, número 11 vezes maior do que o volume aplicado em informação e inteligência (R$ 3,4 billhões). Em alguns estados, o volume gasto em segurança pública é maior do que se gasta com saúde, educação ou previdência social, como é o caso do Rio de Janeiro, Rondônia e Roraima.

Em suma, pagamos para que a polícia saia e “espanque até matar” e não que solucione problemas de segurança pública. Em alguns casos, pagamos mais para isso do que para cuidar do bem-estar social da população, o que é escandaloso.

Não canso de repetir que o modelo de segurança pública militarizado e ostensivo é aplicado há décadas por governos de diferentes partidos e até o momento não resolveu o crime organizado, o tráfico de drogas nem outras questões sempre colocadas no colo da segurança pública. São bilhões que deixamos de investir em educação, saúde, habitação, saneamento básico, programas de transferência de renda e toda uma gama de políticas públicas que criam mais acesso e oportunidades em lugares onde o Estado só chega com a polícia.

Discussões como essas não viralizam nas redes sociais, nas quais algoritmos operam ao bel-prazer do dono da empresa e não rendem audiência para veículos jornalísticos que alertam para esses números. Por isso, precisamos de seu apoio. O jornalismo digital está em um momento de queda de audiência por conta do uso de IA nos motores de busca e a desvalorização de conteúdo jornalístico por algoritmos nas redes sociais. Isso para não dizer que a sustentabilidade financeira tem sido ameaçada.

Você pode ser a chave para mudar essa situação, sabia? Você já segue a Ponte no Instagram e no Blusky? Se já segue, já favoritou nosso perfil no Instagram para sempre receber nosso conteúdo? Costuma compartilhar nosso conteúdo para chegar em mais gente? Já pensou em apoiar financeiramente a Ponte de forma recorrente, pontual ou até via PIX (pontual ou recorrente para a chave relacionamento@ponte.org)?

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